Foto – Doutor Gori
(esquerda) e Spectreman (direita).
Antes mesmo de Jaspion e Changeman dar o ar de sua graça no
Brasil e abrir as portas para que a vinda de uma enxurrada de séries tokusatsu
para cá, outras séries tokusatsu mais antigas também foram exibidas no Brasil
nos anos 1960, 1970 e primeira metade dos anos 1980. Entre elas, Spectreman.
Spectreman é uma série do começo dos anos 1970, produzida
pela P-Productions e pela Krantz Films e criada pelo produtor Sōdži Ušio
(pseudônimo de Tomio Sagisu). A exibição de Spectreman na televisão nipônica, por meio da
Fuji Television, durou de dois de janeiro de 1971 a 25 de março de 1972,
totalizando 63 episódios.
A trama do seriado japonês setentista gira em torno da luta
do androide Spectreman contra o intento conquistador do Doutor Gori, um
cientista nativo do Planeta Épsilon, e seu auxiliar Karas (originalmente Rah), que depois de ter sido desterrado do planeta natal dele resolve conquistar a
Terra ao ver que os seres humanos a estão destruindo por meio de flagelos como
a poluição e a destruição do meio ambiente.
Depois de passagens por países como Estados Unidos, França e
Itália, Spectreman chegou ao Brasil no começo dos anos 1980, tendo tido duas
exibições: uma pela Rede Record entre 1981 a 1982 (em parceria com a TVS Canal
11 – Rio de Janeiro); e de 1983 até 1990 pela TVS (atual SBT). Nas últimas
reprises da série pelo SBT, entre 1988 a 1990, este se aproveitou do sucesso de
Jaspion e Changeman para “reviver” o herói setentista.
A dublagem brasileira foi feita em São Paulo, e ficou a
cargo dos estúdios da Com Arte, com base na versão norte-americana. Por conta
disso que algumas das alterações de nomes feitas nos Estados Unidos vieram para
cá. Alguns personagens, como é o caso de Kato (originalmente Kaga), tiveram
seus nomes alterados por questão de cacofonia (em outras palavras, para que o
personagem em questão não virasse objeto de certas piadinhas infames – algo que
também veio a se repetir em séries tokusatsu dos anos 1980 e 1990, como foi o
caso do mantra da bruxa Kilza em Jaspion, que originalmente era “beremekan
katabumda” e virou “berebekan katabamba” no Brasil. O caso do Green Flash e do
Blue Flash em Flashman, que originalmente se chamavam Dai e Bun,
respectivamente, e no Brasil foram rebatizados como Dan e Go. Entre outros que
podemos ficar citando).
A dublagem de Spectreman contou com muitos nomes que anos
depois participaram de Chaves e Chapolin, tais como Mário Vilela, Marcelo
Gastaldi, Eleu Salvador, Jorge Pires, Osmiro Campos, Carlos Seidl, Leda
Figueiró e outros. Também participaram dubladores que mesmo não tendo feito
parte do elenco de Chaves e Chapolin, participaram das séries tokusatsu que
vieram para cá a partir de Jaspion e Changeman, tais como Marcos Lander,
Francisco Borges e João Paulo Ramalho. Este último, notório por ter sido a
principal voz do astro de filmes de ação Chuck Norris em São Paulo, teve uma
trajetória bem interessante na dublagem das séries tokusatsu, visto que em
Spectreman dublou um dos heróis secundários da trama, Kato, e depois nos
seriados dos anos 1980 e 1990 tornou-se notório por ter emprestado sua voz
forte a vários vilões, como o Doutor Jean Marie em Jiban, o Imperador Neroz em
Metalder e o Grande Rei em Kamen Rider Black. Na Gota Mágica, dublou Lúcifer no
especial do Armageddon em Cavaleiros do Zodíaco e Hadler em Fly: o pequeno
guerreiro (episódios 6 a 8).
Também participaram da dublagem de Spectreman dubladores que
tempos depois se mudaram para o Rio de Janeiro e participaram da dublagem de
desenhos oitentistas como Thundercats, He-Man, Silverhawks e outros, como Marcos
Miranda e Francisco José. Muitos desses dubladores veteranos, a maioria deles
já finados, são egressos da AIC (Arte Industrial Cinematográfica), um dos
estúdios pioneiros na arte da dublagem em São Paulo.
E uma curiosidade a respeito de Spectreman é que
originalmente, quando a série foi lançada no Japão, o seriado levava não o nome
do herói, e sim o do vilão da série, visto que se chamava “Učuu Endžin Gori” (“Símióide Espacial Gori”). E assim o
foi durante os 20 primeiros episódios da série, até em decorrência de que no
episódio 21 o título foi alterado para “Učuu
Endžin Gori tai Supekutoruman” (“Símióide Espacial Gori contra
Spectreman”). Novamente veio a ser alterada no episódio 40 para apenas
Spectreman (que por sua vez virou o título internacional da série).
Como já dito antes, Spectreman tem ao todo 63 episódios. Mas
destes 63 episódios, você encontra 60 deles com a dublagem brasileira. E isso
tanto em DVDs genéricos (como aqueles lançados pela Dream Anime Club em meados
dos anos 2000) quanto em episódios pela Internet (incluindo canais do You Tube
com episódios do seriado, como é o caso do canal Máquina do tempo, que possui
uma playlist com a série na íntegra). E os episódios que estão sem a dublagem
brasileira são os episódios 25 (Uma arma para Spectreman), 26 (Uma arma para
Spectreman - epílogo) e 27 (A batalha titânica dos sete monstros gigantes).
Segundo postagem feita na página do Facebook “Artes dos
Tokusatsus”, feita no dia 1º de julho de 2020, esta é a sinopse do episódio 25
de Spectreman:
“Vindo de um meteoro,
Satan King apareceu. Sob o controle do Doutor Gori, a fera estava prestes a
destruir a Terra. Spectreman foi convocado pelo Soberano (chamados no Brasil de
Dominantes) e lutou contra o monstro, correndo o risco de ter seu braço quase
destruído. No entanto, o meio de chegada da besta, o meteoro, teve um efeito
colateral invisível. Sua explosão maciça matou o bebê do monstro antigo,
Magulah.
O monstro Magulah era
um monstro antigo que dormia no subsolo com o bebê ainda no ovo. Foi acordado
quando o monstro Satan King, do Dr. Gori, pousou na terra. Isso não apenas fez
o monstro acordar, mas também matou o bebê. Logo veio à tona exatamente quando
Satan King estava lutando com Spectreman. Embora com Spectreman descartado por
Satan King, Dr. Gori chocado ao ver um monstro que não é de sua criação envia o
monstro rei para atacar. Ambos conseguem fazer golpes severos um com o outro,
como Magulah jogando uma pedra na cabeça de Satan King e o rei Satanás mordendo
o braço de Magulah.
Eventualmente, Satan
King foi finalmente forçado a recuar. Magulah então vai checar seu bebê e
encontra-o morto. Irritado, o monstro começou a se enfurecer, o monstro começou
a se enfurecer, o que forçou Jôji a ser força para se tornar Spectreman.
Máquina e monstro lutaram entre si, mas Magulah ganhou vantagem ao quebrar um
dos braços de Spectreman e depois se retirou para o subsolo”.
Foto – Belzebu (originalmente Satan King).
A mesma página também traz uma sinopse para o episódio 26,
na mesma postagem:
“Magulah agora no
subsolo, foi direto à cidade para atacar Satan King. Quando os dois monstros
entraram em conflito, destruindo tudo o que atingiram, Spectreman apareceu e
voou para longe para levar os dois monstros para fora da cidade.
Embora ambos tenham
sido persuadidos, Magulah se afastou e viu Satan King enfrentar Spectreman e o
nosso herói armado com sua nova arma, a Spectre-Gun, Spectreman destruiu Satan
King de uma vez por todas. Magulah então apareceu e, embora Spectreman tenha
tentado argumentar com ele e dito para deixar o monstro ainda irritado com a
morte do bebê, atacou Spectreman.
O monstro então atacou
Spectreman outra vez, mas se tornaria uma ruína quando o monstro e o herói
caíssem de um penhasco no oceano onde o monstro morreu. Kenji, no entanto,
sentiu pena dos monstros por ser vítima dos planos malignos do Dr. Gori e, em
seguida, espíritos de pais e filhos foram vistos desaparecendo no céu noturno,
segurando a mão um do outro”.
Foto – Magulah.
Quatro dias mais tarde, a mesma página também postou uma
sinopse do episódio 27, “A arena dos monstros”, dividida em duas partes, visto
que neste episódio somos apresentados a dois novos monstros, Donchinodon
(originalmente Mogz) e X (originalmente Silver Robot).
“A História do Monstro
Donchinodon (Mogz):
Gori enviou Mogz para
testar sua nova criação, Silver Robo. Durante a luta, Mogz usa sua cortina de
fumaça para escapar dos ataques de Silver Lobo, mas Mogz foi encontrado
facilmente porque Silver Lobo podia ouvir o rugido do kaiju e, em seguida,
Silver Lobo usou as lâminas de seu braço para cortar Mogz. Mogz caiu em uma
pedra e sangrou até a morte”.
Foto – Donchinodon (originalmente Mogz).
“A História do Monstro
X (Silver Robot):
Um ciborgue criado
pelo Dr. Gori, ele deu à sua criação vários poderes baseados nos próprios
poderes de Spectreman.
Para testar o valor,
ele envia para a briga de vários outros monstros que ele havia revivido como
sujeitos de teste. Na chegada, ele desafia Mogz. Mogz parecia ter vantagem
sobre sua cortina de fumaça, mas o barulho dos monstros denunciou sua posição e
logo Silver Robo cortou Mogz fazendo com que ele sangrasse até a morte.
Ele então desafiou o
Gokinosaurus II, e o monstro da barata parecia ter vantagem em voar ao seu
redor, mas Silver Robo usou suas Explosões de Energia e atirou nele no ar,
fazendo-o explodir em pedaços menores. Silver Robo continuou seu ataque ao
Baronsaurus II e ambos pareciam igualmente iguais, mas Silver Robo jogou o
Baronsaurus II em Mogunetudon II e por causa de seu hálito de fogo no
Baronsaurus II.
Moguntudon II agora o
enfrentaria e enterraria no subsolo para ceder o Silver Robo, mas, quando o
monstro do peixe-gato subiu à superfície, o ciborgue usou as lâminas do braço e
cortou a cabeça da criatura. Silver Robo seguiu para Nezubirdon II, que estava
atacando Jôji e outros dois amigos em uma caverna. O monstro rato parecia
ganhar vantagem com as duas cabeças e cauda, mas o ciborgue se soltou da
cauda e decapitou as cabeças de Nezubirdon II.
As duas cabeças
voltaram e começaram a morder seus ombros. Spectreman então entrou em cena, assim
como Silver Robo lidou com as cabeças das duas criaturas e os dois gigantes
começaram sua batalha. Silver Robo pareceu ganhar vantagem, até que ele recuou
em algumas torres elétricas, fazendo seu corpo esquentar imensamente.
Encontrando sua fraqueza, Spectreman então dispara uma névoa gelada no monstro,
fazendo com que ele congele e acabe desmoronando”..
Foto – Monstro X (originalmente Silver Robot).
Segundo consta no artigo da Wikipédia em português sobre a
série, os episódios em questão foram sim exibidos no Brasil. Os episódios 25 e
26 (intitulados “Uma arma para Spectreman”) foram exibidos na TV Record em 1981
e 1982 e na TVS entre 1983 a 1986, embora não tenham sido exibidos na última
exibição da série (1988 a 1990). Já o episódio 27, “A arena dos monstros”, foi
exibido apenas na TV Record em 1981 e 1982.
Sobre o motivo pelo qual estes materiais com o áudio em
português brasileiro se perderam, tudo leva a crer que se perderam no meio do
acervo do SBT/TVS. À época, a sede do SBT ficava na Vila Guilherme em São Paulo,
bairro da zona norte localizado próximo às margens do Rio Tietê. Tal
localização, infelizmente, tornava a sede do SBT à época uma presa fácil para
enchentes e inundações, principalmente em dias de chuvas torrenciais que se
estendiam por vários minutos e mesmo horas. E assim o foi nos anos 1980 e 1990,
sendo a maior delas a de janeiro de 1987, segundo o livro “Almanaque do SBT”,
lançado em 2017.
Segundo trecho do artigo publicado em 19 de agosto de 2020 no
site do SBT, em comemoração aos 39 anos da emissora paulistana:
“04 - Entre os anos de
1982 e 1998, o SBT São Paulo, localizado na Vila Guilherme, sofreu com
inundações. Arquivos da emissora foram destruídos pelas águas do Rio
Tietê. Além disso, as enchentes chegaram a atrapalhar as gravações de programas
como: Bozo, Show Maravilha, Casa da Angélica, O Povo na TV e da novela Destino”.
O texto acima nos dá uma noção do o quão eram problemáticas
as enchentes do Rio Tietê para o SBT no período de 1982 a 1998, e de todo o
transtorno que a fúria da natureza causou à emissora de Sílvio Santos. Por
conta das enchentes, programas ao vivo foram interrompidos, gravações
canceladas, arquivos foram destruídos e se perderam. Infelizmente, para todo o
sempre, nas areias do tempo.
E entre esses arquivos, certamente as másters com os episódios 25 a 27 de Spectreman em alguma dessas enchentes lá estavam. Levando em conta o fato de que os episódios em questão, segundo informações da Wikipédia em português, foram reprisados até a exibição da série pelo SBT em meados dos anos 1980, é possível que tenham se perdido na enchente de 1987. Elas devem ter sido tão afetadas que, mesmo que não tenham sido destruídas pelas enchentes, ficaram em um estado tão precário que impossibilitou novas reprises dos mesmos. Foi apenas em 1996, quando o SBT abandonou a sede da Vila Guilherme e se mudou para o Complexo Anhanguera, em Osasco (Grande São Paulo), é as enchentes deixaram de ser um problema para a emissora de Sílvio Santos.
Foto – Antiga sede do SBT na Vila Guilherme. Data desconhecida.
E, para piorar ainda mais as coisas, como os episódios em
questão foram poucas vezes reprisados, encontrar alguém que tenha gravado os
episódios da TV em fitas VHS e tenha a gravação dos mesmos até hoje é que nem procurar
agulha em um palheiro.
Mas, como diz o ditado, a esperança é a última que morre. Um dos episódios até então perdidos de Metalder (série sobre a qual falaremos em um artigo futuro), o décimo, "O robô filarmônico", foi encontrado no ano passado.
Talvez também exista algum colecionador que tenha gravado os episódios em questão de Spectreman em fita VHS e os tenha guardados até hoje, em bom estado, para que os episódios 25 a 27 de Spectreman com o áudio em português brasileiro e com a dublagem clássica feita pelos estúdios da Com Arte no começo dos anos 1980 possam novamente ver a luz do dia.
Fontes:
Descubra 39 curiosidades sobre os bastidores do SBT.
Disponível em: Descubra
39 curiosidades sobre os bastidores do SBT - SBT
Nos anos 1980, enchentes destruíram cenários e tiraram
programas do SBT do ar. Disponível em: Nos
anos 1980, enchentes destruíram cenários e tiraram programas do SBT do ar ·
Notícias da TV (uol.com.br)
Spectreman. Disponível em: Spectreman – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)